Olá,
passei estes dois últimos meses preparando uma fala para o "I Simpósio Psicologia e Sociedade" do Núcleo Paradigma, um espaço de formação de Analistas do Comportamento, que aconteceu neste sábado.
Neste simpósio, minha fala foi sobre psicoterapia e feminismo e, além de meu tema, pude participar ouvindo a apresentação de colegas psicólogos falando sobre o trabalho com a questão racial (especialmente a questão dos negros) e a psicologia num CRAS em Atibaia, sobre o trabalho com uma ONG que defende direitos LGBTs na cidade do Rio de Janeiro e sobre a abordagem da psicologia jurídica em Curitiba, no trabalho com adolescentes que cometeram atos infracionais.
Todas as realidades destacadas colocavam as dificuldades em nosso trabalho com populações que chamamos de minorias, com pessoas que sofrem opressão, uma opressão que muitas vezes é naturalizada a tal ponto que não conseguimos distingui-la como algo que está errado, por ser tão habitual.
O preconceito contra os negros, contra os indivíduos da comunidade LGBT ou contra os deficientes ou aos pobres é tão grande, tão arraigado em nós que muitas vezes nós não conseguimos reconhecer ou fazer diferente a não ser nos calar diante da violência e da exclusão causada a elas pelas pessoas. Na questão da mulher então, é absurda essa naturalização da violência.
A questão é que se calar e não atuar contra essa lógica de violência é o mesmo que aceitar, se mostrar conivente e apoiar essa atuação das pessoas.
Conheci através deste simpósio alguns grupos que abrem espaço para reflexão e acolhimento destas populações que não estão representadas na mídia e portanto no imaginário social, sentindo-se ainda mais excluídos.
A internet vem criando espaços para que esta população possa se encontrar e encontrar modelos diferentes da "norma" social padronizada que coloca os homens, brancos, heterossexuais e cisgêneros como a única possibilidade de existência digna.
Grupos no facebook, canais no youtube, revistas, coletivos de pessoas vem brigando por cavar espaço de existência, mostrando que estas pessoas negras, lésbicas, gays, transgêneros, pobres, mulheres, existem e tem muito a dizer!
Apenas através desse posicionamento, fazendo um espaço de existência e problematizando a realidade delas é que estas comunidades vão chegar aos jovens e pessoas que sofrem preconceito com sua inadequação ao modelo hegemônico, fazendo-os se sentirem parte de algo maior, parte de um grupo e não uma exceção que deve ser abolida, como muitos pensam sobre si mesmos ao descobrirem-se diferentes.
A representatividade que não aparece nas mídias tradicionais e nos espaços socialmente compartilhados ão ganhando espaço com a voz que estes coletivos dão ao um grupo que vai se aglomerando e crescendo, construindo um imaginário possível para si mesmo.
Canais como o "Canal das Bee", sobre a comunidade LGBT, ou o "Afros e Afins" sobre a comunidade negra, ou mesmo o "Jout Jout" que trata do feminismo de forma leve e acolhedora, abre caminhos e traz muitas outras pessoas no meio do Youtube e de fora dele, da comunidade, que contam e compartilham experiências incríveis de se relacionar com as diferenças de uma forma mais tranquila da que temos lidado.
Meu recado aqui e para muitos de meus pacientes que chegam num isolamento, se sentindo completamente sozinhos, é sempre o mesmo: Vá procurar a sua turma! Ela existe com certeza e está aberta a você seja para apenas observar e se sentir menos sozinho, seja para de fato se engajar e entrar numa comunidade nova, a princípio virtualmente e, se você quiser, na vida real também!
Representatividade é apenas isso: não se sentir sozinho, ter alguém no mundo que te represente. Isso é fundamental para nossa formação, para nos agarrarmos a uma possibilidade de futuro, de vida possível, de ideal de nós mesmos e muda completamente a nossa relação com a nossa própria história e com o mundo a nossa vida, trazendo saúde mental ao invés de sofrimento.
Vamos aproveitar o que os meios de comunicação e as redes sociais tem de melhor que é possibilitar o encontro? De nós conosco mesmos e com outros que nos façam bem?
Saí deste simpósio contente com as movimentações feitas pelas pessoas, em especial pelos jovens, e com certeza, apensar de muito mobilizada pela realidade que ainda é muito dura, também saí esperançosa pelo o que estamos construindo pela frente!
Sigamos resistindo!
Um abraço!
Carol
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segunda-feira, 14 de novembro de 2016
quarta-feira, 23 de março de 2016
Como identificar quando precisamos de terapia?
Olá,
Nas últimas semanas, por acaso, alguns amigos próximos e outros nem tão próximos, vieram me pedir ajuda para encontrar uma psicóloga ou um psicólogo para eles, já que não podemos atender pessoas que tenham um vínculo próximo conosco como psicólogos, pela questão ética de separar o momento de cuidado da vida pessoal, o que pode atrapalhar neste tipo de atendimento tão profundo e delicado.
O que me dei conta nestes pedidos é que as pessoas não sabem muito bem identificar muitas coisas em relação ao atendimento psicológico, e que idealizam e mistificam a imagem da terapia, provavelmente pelo modo com ela aparece na mídia e nos filmes ou seriados. Por conta disso, gostaria de dar uma contribuição, ajudando a explicar um pouco como isto funciona.
Para começar, é importante lembrar que a busca por uma terapia pode partir de diversas fontes, desde a sugestão de algum amigo ou familiar, de orientação médica ou pedagógica, no caso das crianças, até da necessidade pessoal de ajuda para elaborar algum evento pontual, do presente ou do passado, ou mesmo pela curiosidade de compreender melhor alguma coisa sobre você mesmo, algum traço que o incomode ou intrigue.
Para começar, é importante lembrar que a busca por uma terapia pode partir de diversas fontes, desde a sugestão de algum amigo ou familiar, de orientação médica ou pedagógica, no caso das crianças, até da necessidade pessoal de ajuda para elaborar algum evento pontual, do presente ou do passado, ou mesmo pela curiosidade de compreender melhor alguma coisa sobre você mesmo, algum traço que o incomode ou intrigue.
Todas estas situações podem ser uma abertura potencial para a busca de terapia e a ideia principal que quero passar é que, mesmo que você conheça um pouco do que é a psicologia, ou seja, algumas linhas teóricas e abordagens que existem dentro dela, como a psicanálise, a comportamental, a Junguiana, a Existencial, a Reichiana corporal, entre tantas outras, o que mais importa, não é a busca pela abordagem. A não ser é claro, que você seja da área e queira experimentar uma ou outra.
O que mais interessa é a possibilidade de fazer um vínculo de confiança, e isto não é a abordagem que a sua psicóloga estudou que irá definir, e sim, a empatia. Por conta disso, há uma convenção geral entre os psicoterapeutas de que o paciente pode passar por entrevistas com diversos profissionais antes de se decidir, assim como acontece com qualquer serviço.
É comum que a pessoa que se sente acolhida de fato, não precise continuar procurando, pois afinal, não é nada fácil falar sobre a dificuldade que lhe leva a procurar ajuda, ainda mais muitas vezes em seguida. Não se preocupe se você não se sentir conectada com uma primeira entrevista, você pode procurar uma outra pessoa e falar sobre isso abertamente com quem lhe atender, pois nós estamos preparados para isso.
O principal em um atendimento psicológico é sua capacidade de confiar e portanto se abrir. Existe um contrato que pode ser feito verbalmente ou não, de que tudo o que se fala dentro do consultório ficará lá. É o contrato de sigilo profissional. É ele que garante a você paciente que suas informações, suas dores, suas mais complexas emoções vão estar protegidas na mão do profissional que você contratou.
Não existe uma formula mágica que faça uma pessoa confiar na outra, a não ser a empatia e a sensação de acolhimento que uma conversa pode trazer e a postura de profissionalismo que ela passa, demonstrando a seriedade no trabalho com você. Isso aparece de diversas maneiras e você perceber se o psicólogo está te escutando ao longo da sessão, se está presente nos horários combinados, se há nele a memória de sua história nas sessões seguintes, ajudando você a fazer as conexões que precisa com o material vem trazendo a ele, entre outras coisas.
Não é preciso nutrir afeto pelo psicólogo o tempo todo, afinal, falando sobre coisas tão difíceis, podemos sentir raiva e detestar quem nos fez enxergar algo ruim em nós mesmos ou em alguém que amamos, ou ainda enxergar um comportamento que não gostamos, mas que fazemos por hábito ou por nunca termos pensando nele com clareza anteriormente.
Uma sessão de terapia não é sempre agradável, muitas vezes é dura, desafiadora e difícil. Não é a toa que a maioria dos consultórios tem uma caixinha de lenços ao alcance do paciente. É comum se emocionar e perder um pouco o controle das emoções tratando de alguns assuntos com mais profundidade e clareza. E isso não é um problema. Ao contrário, pode ser a porta de entrada de mudanças significativas e pode quebrar uma forma de ação com si mesmo que poderá melhorar muito a forma como você se relaciona e se posiciona com as outras pessoas, coisas e decisões na vida.
Espero ter ajudado de alguma forma com estes esclarecimentos.
Um abraço!
Carol
carolinatorrespsicologa.blogspot.com.br
O que mais interessa é a possibilidade de fazer um vínculo de confiança, e isto não é a abordagem que a sua psicóloga estudou que irá definir, e sim, a empatia. Por conta disso, há uma convenção geral entre os psicoterapeutas de que o paciente pode passar por entrevistas com diversos profissionais antes de se decidir, assim como acontece com qualquer serviço.
É comum que a pessoa que se sente acolhida de fato, não precise continuar procurando, pois afinal, não é nada fácil falar sobre a dificuldade que lhe leva a procurar ajuda, ainda mais muitas vezes em seguida. Não se preocupe se você não se sentir conectada com uma primeira entrevista, você pode procurar uma outra pessoa e falar sobre isso abertamente com quem lhe atender, pois nós estamos preparados para isso.
O principal em um atendimento psicológico é sua capacidade de confiar e portanto se abrir. Existe um contrato que pode ser feito verbalmente ou não, de que tudo o que se fala dentro do consultório ficará lá. É o contrato de sigilo profissional. É ele que garante a você paciente que suas informações, suas dores, suas mais complexas emoções vão estar protegidas na mão do profissional que você contratou.
Não existe uma formula mágica que faça uma pessoa confiar na outra, a não ser a empatia e a sensação de acolhimento que uma conversa pode trazer e a postura de profissionalismo que ela passa, demonstrando a seriedade no trabalho com você. Isso aparece de diversas maneiras e você perceber se o psicólogo está te escutando ao longo da sessão, se está presente nos horários combinados, se há nele a memória de sua história nas sessões seguintes, ajudando você a fazer as conexões que precisa com o material vem trazendo a ele, entre outras coisas.
Não é preciso nutrir afeto pelo psicólogo o tempo todo, afinal, falando sobre coisas tão difíceis, podemos sentir raiva e detestar quem nos fez enxergar algo ruim em nós mesmos ou em alguém que amamos, ou ainda enxergar um comportamento que não gostamos, mas que fazemos por hábito ou por nunca termos pensando nele com clareza anteriormente.
Uma sessão de terapia não é sempre agradável, muitas vezes é dura, desafiadora e difícil. Não é a toa que a maioria dos consultórios tem uma caixinha de lenços ao alcance do paciente. É comum se emocionar e perder um pouco o controle das emoções tratando de alguns assuntos com mais profundidade e clareza. E isso não é um problema. Ao contrário, pode ser a porta de entrada de mudanças significativas e pode quebrar uma forma de ação com si mesmo que poderá melhorar muito a forma como você se relaciona e se posiciona com as outras pessoas, coisas e decisões na vida.
Espero ter ajudado de alguma forma com estes esclarecimentos.
Um abraço!
Carol
carolinatorrespsicologa.blogspot.com.br
quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016
O abandono e sua consequências
Olá,
Hoje venho compartilhar com vocês uma atuação muito específica de minha clínica: o trabalho com crianças em situação de acolhimento.
Desde 2008 atendo crianças nesta situação de forma voluntária, em troca da participação em uma rede de atendimento às casas de acolhimento, aos grupos de supervisão dos casos e, principalmente, também em troca de uma experiência de contato com adultos que fazem parte do acolhimento de uma situação absolutamente vulnerável na vida das crianças e com estas crianças e adolescentes em situações terríveis.
Ao longo destes anos de experiência com o contato e com o atendimento a esta população aprendi muito sobre a amplitude e profundidade do trabalho psicoterapêutico, sobre a importância do trabalho em rede e com conexão entre as tantas facetas do mundo destas crianças que é amplamente institucionalizado, da casa à escola, passando por serviços que oferecem cursos, tratamentos médicos, psicológicos, fonoaudiológicos, reforço escolar e até mesmo treinamento profissional.
Nosso trabalho na clínica é ajudá-los a amarrar diversos pedaços. Desde a sua história de separação de seu núcleo familiar, que nunca vem livre de algum tipo de violência, seja ela física, emocional ou psicológica, elaborando o passado recente ou distante, um presente instável e atravessado por muitas pessoas diferentes e por um futuro normalmente nebulosos e cheio de dúvidas.
Para o trabalho clínico, essas crianças chegam armadas de defesas por todos os lados, com muito medo de perder novamente e por conta disso, a dificuldade de confiar e de se vincular é imensa. Trabalhamos por semanas, meses e ás vezes por anos, esperando que elas sintam a consistência do vínculo de alguma forma e que com esta experiência possível de confiança, possam algum dia, confiar novamente nos vínculos que irá formar, seja com pais substitutos, no caso de crianças pequenas ou de até 12 anos, seja com outras pessoas com quem irá conviver na vida. Depois dessa idade, raras são as famílias que adotam no Brasil, restando alternativas internacionais e, por conta disso mesmo, são mais delicadas, pois exigem um esforço maior da criança com a linguagem.
No caso de adolescentes sem esta perspectiva de adoção, a rede trata de tentar "preparar" para vínculos saudáveis, para uma possível introjeção de valores que os ajudem nisso e também para o mercado de trabalho. Há opções de treinamentos, de trabalhos como aprendizes e uma preocupação com as moradias, repúblicas e outros mecanismos de moradia coletiva que seja constituída de pares com quem o adulto que saí deste sistema possa se identificar e se organizar minimamente numa vida produtiva.
Todo o processo institucional não ajuda muito estes adolescentes a desenvolverem autonomia em seu processo, pois ele deve prestar satisfação de sua rotina e de seus passos a muitos lugares e pessoas diferentes e que não são tão bem amarrados em sua comunicação. Eles têm pouco espaço para traçar um caminho próprio, mesmo que seja de desejo e de sonho para si mesmos e na clínica também tentamos ajudá-lo a se independer destes caminhos pré-estabelecidos, tentando na comunicação com Casa de acolhimento, Fórum e com ele, buscar um espaço de existência singular e própria.
Tudo isso só é alcançado com muita sorte, quando o vínculo conosco é suportado pela criança que chega, e quando a parceria com as demais instituições ocorre, o que depende muito de nós e de nosso esforço em travar essa parceria e de não desistir jamais de fazer o que for possível por cada um deles.
O abandono inicial, que pode ser causado por inúmeros fatores, de morte ou encarceramento dos pais à uma inabilidade funcional, psicológica ou material deles de cuidarem da criança, via denúncia ao conselho tutelar ou por busca de ajuda pelos pais, já é muito traumático. Mas ele pode ser duplamente agravado pelo próprio sistema de acolhimento que pode ser disfuncional, causando na criança um segundo abandono por suas vias burocráticas e lentas, como é o caso de muitos dos processos dentro das varas de infância.
Um caso que recentemente me chama muito a atenção é ter chegado a mim um caso de devolução por pais adotivos. Neste sentido, não posso deixar de me indignar pela criança por ela ter sofrido um segundo abandono que não pode acontecer. E que mesmo que haja uma pensão advinda destes "pais" até 21 ou 24 anos, esta criança não poderia ter, pela segunda vez, a sensação de que ela não é digna do amor de um casal de adultos.
Escrevo com o coração pesado e com muita, mas muita determinação em ajudar esta criança a entender que o problema não está nela e que ela pode se dar mais uma chance de confiar em alguém.
Espero que eu consiga!
Um abraço!
Carol
quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016
Como sobreviver à separação
Na semana passada falei sobre a crise como uma oportunidade na relação, como pode acontecer no caso de um casal que decida encarar um ao outro mesmo com suas diferenças e medos e que decidam finalmente ficarem juntos.
Mesmo assim, é preciso pensar no pior, que muitas vezes acontece, de haver um separação de fato. Não há uma forma ideal de lidar com isso e muito menos um motivo apenas para um casal decidir se afastar.
Nem sempre é um decisão de ambos os lados, quase nunca é algo que possa ser elaborado com facilidade e pode ser por diversos motivos, alguns menos dolorosos, como um desentendimento e um afastamento gradual pelos dois lados irem se diferenciando muito um do outro e mudando a forma como encaram a vida e a si mesmo, e consequentemente o outro. Outros são mais dolorosos, como o apaixonamento de uma das partes por outra pessoa, com ou sem uma traição real.
De qualquer maneira, apesar da imensa falta que uma pessoa possa sentir da outra após a separação, a elaboração dos motivos dela são uma das parte mais dolorosas e inevitáveis. Pensar o que poderia ter sido feito ou dito de outra forma e reviver milhares de vezes conversas e diálogos imaginários desgastam e geram muita angústia, mas ajudam a elaboração ser concluída, quando não podem ocorrer na realidade com a pessoa real por raiva, rancor, ou por outros motivos.
Ums parte muito difícil nos casos de separações não amigáveis é quando existem filhos ou animais de estimação que sejam dos dois, em que a convivência pode ser muito diminuída ou eliminada, gerando a chamada alienação parental, muito dolorosa para a parte que acaba sem a guarda ou sem o direito de visita, numa separação mais agressiva, além de gerar muito sofrimento à criança ou animal.
A outra parte a ser elaborada e que merece nossa atenção, por parecer menos comentada pelas pessoas neste tema, é a redefinição de papéis a serem exercidos no mundo.
Muitos de nós somos criados para nos casar e formar uma família. Quando um casamento acontece encarnamos num papel que idealizamos para nós mesmos a partir do desejo de quem nos criou e da introjeção destes valores que nos levam a querer ser parte de uma instituição familiar tradicional e estável. Na realidade, esse modelo não é o único a ser seguido e nem sequer o melhor. Podemos nos relacionar da forma como quisermos e temos o direito de errar e de tentar outras vezes até decidirmos se queremos ou não o modelo apresentado, criando o nosso próprio modo de viver em casal ou fora dele, se assim preferirmos.
Porém, como esta pressão social e familiar é muito intensa, quando um casamento se rompe, acontece uma desestruturação muito mais profunda do que apenas a material, de dissolução de um lar, que já é muito dolorosa e simbólica. Acontece a pior parte que é a desestruturação de um papel social e pessoal que assumimos neste lugar "ideal" (por pior que a relação estivesse antes da separação).
Este papel que se encaixa muito confortavelmente por ser o que esperam de nós, é o papel de esposa ou de marido, de namorada ou companheira, de parceira, enfim, de acompanhada. Para as mulheres, por muitos anos, o papel de esposa de alguém foi o único papel aceitável e respeitável numa sociedade e sofremos o ranço destas concepções de mulher. Mesmo assim, para os homens não é fácil deixar o papel de marido ou de provedor rompendo também com um papel esperado e cheio de significados e pressão.
Quando a separação se dá e é finalmente decidida, não é nada fácil pelas possíveis saudades reais do companheiro, mas principalmente pelo luto deste papel idealizado que nos dá uma identidade confortável no mundo.
Nos acostumamos a ser "a esposa de fulano" ou "o marido de ciclana" e dependendo da duração desta relação e de suas raízes em nossa psique, não conseguimos nos enxergar como nenhuma outra coisa, mesmo tendo muitas outras funções e papéis no mundo em outras relações. Nos sentimos esvaziados de sentido, desconhecemos outro papel a exercer nas relações com as pessoas sem aquele papel que julgávamos principal.
A maior dor e o lugar que mais precisa ser trabalhado é esse: como viver sem o olhar do outro? Como viver sem o papel que se exercia naquela relação? Como ser alguém sem ser para agradá-lo? Como pensar em atividades cotidianas que não incluam a presença dele?
Não é simples, mas é importante pensar que antes de conhecermos esta pessoa, já existíamos, já havia vida antes da pessoa chegar e, do mesmo modo, é preciso se esforçar muitas vezes para pensar nisso, mas haverá uma vida após a pessoa sair de nossa vida como parceiro.
Não precisamos de um parceiro amoroso para viver. Podemos viver sem ele. E, além de tudo, para ter uma relação mais saudável possível da próxima vez, é importante se lembrar de não precisar do outro, pois quando precisamos, a relação não funciona bem. É imprescindível que a gente saiba que não precisa do outro para viver bem na relação, com ele ao lado, como uma companhia desejada, mas nunca com uma muleta. É preciso andar com as próprias pernas e deixar que o outro ande com as dele, daí sim, tê-lo ao lado para caminhar o caminho dele, ao seu lado, mas não por você.
A fantasia de amor romântico e apaixonado que mistura as almas dos amantes e que faz esta ideia de cara-metade, tampa-da-panela ou metade-da-laranja não facilita para pensarmos numa relação boa e real, mas sim numa simbiose que não se sustenta após a real aproximação entre as pessoas, pois se baseia na ilusão do apaixonamento que dura pouco e não faz jus ao que uma relação é.
Deste modo, vale a pena tentar retomar sua personalidade, com os ganhos e aprendizados que a relação lhe trouxe para o bem e para o mal e seguir adiante tentando, se for o caso, não repetir os mesmos erros na próxima vez.
Os papéis não precisam se perder junto com a relação, mas se reconfigurar e serem re-significados para a nova fase da vida que surge após o término e nas novas relações que forem surgindo.
Há vida após a separação e ela pode ser boa e feliz!
Um abraço,
Carol
carolinatorrespsicologa.blogspot.com.br
quarta-feira, 27 de janeiro de 2016
Crises como oportunidades no relacionamento
Olá,
Nesta semana quero falar sobre as relações amorosas. Não é nada raro em consultório sermos procuradas em momentos de crise de relacionamento afetivo.
Normalmente acontece de uma pessoa estar com muito medo de perder a outra e de ficar sozinha. Ou então, há fantasias sobre o desejo do outro por outras pessoas que não ela. Ou ainda há uma insatisfação com o que o outro oferece na relação que não é suficiente ou não está de acordo com o que pessoa espera dele.
Em relacionamentos afetivos, vejo um caminho sempre semelhante, pois apesar de cada caso acontecer dentro de um contexto completamente diferente e particular, o que acontece é sempre um apaixonamento.
A principio não sabemos o que é o outro, não conhecemos o outro, e na paixão colocamos nele aquilo que mais queremos em alguém, na idealização que temos de um relacionamento que provem das relações que observamos na vida real (de nosso pais, tios, avós, etc) e do que vemos no ambiente ficcional, da fantasia (filmes, livros, séries, desenhos, etc) e vamos formando uma ideia do que é um relacionamento e de como queremos o nosso.
O que vemos no outro, nem sempre, ou, quase nunca, é o que ele é de verdade. Vemos uma possibilidade de parceria com uma ideia de um outro. Ao longo de um relacionamento de longo prazo, vemos o outro e tentamos encaixá-lo nessa nossa fantasia, mas, aos poucos, esse outro vai se tornando real e isso pode ser muito assustador.
O outro também faz isso conosco e pode ter momentos em que percebe coisas em nós que não estava "em seus planos" (da fantasia) e que pode fazê-lo ter medo e se questionar, gerando uma crise.
Normalmente, em casamentos estáveis e longos, essas crises vêm junto com uma crise real, seja uma doença, um acidente na família, uma questão financeira grave, entre outras coisas que abalam o dia a dia e a forma de viver a qual o casal se acostumou.
É comum, por exemplo, num casal em que alguém sempre toma as decisões e organiza a vida doméstica ou financeira, que quando esta pessoa fica fragilizada ou não pode cuidar das coisas, o outro que não está acostumado a fazer isso, se sinta mal, sobrecarregado ou aflito por ver fragilidade no outro quando este era seu porto seguro.
Não há receita de como devem ser as relações e estes papéis vão sendo decididos silenciosamente, sem sabermos que somos, por exemplo, o provedor, ou o porto seguro do outro, mas nos tornamos e nos habituamos aos variados papéis que vão sendo atribuídos de um para o outro.
Quando isto acontece, a crise pode vir caso estes papéis precisem se movimentar e isso pode mexer em fantasias muito antigas no relacionamento entre os dois e também do relacionamento de cada umas das pessoas com si mesmas e outras pessoas com as quais se relacionaram antes.
Não é possível saber como lidar com isso de uma forma geral, pois cada um tem uma historia de vida. Mas é possível perceber o seu lugar numa relação e, se está em crise, tentar ver que parte desta crise pertence a você mesmo, o que você está cobrando do outro que na verdade não deveria cobrar. O que incomoda mais em você mesmo na relação é só o que você pode mudar. E é sempre, sempre, sempre bom conversar e tentar entender o ponto de vista do outro, para ver que nem tudo é como você imaginava e que talvez, vocês ainda não se conheçam bem.
Não é muito fácil conhecer o outro mesmo morando com ele, tendo filhos com ele, passando a vida juntos. O momento mais fácil de conhecer o outro é o momento de crise. Onde a fragilidade traz emoções a flor da pele e aí sim você sabe com quem está lidando. Não é nada fácil ficar doente, perder alguém importante da família, ter um filho doente, ter dificuldade de engravidar, sofrer um acidente, perder o emprego ou passar por outras necessidades básicas, sejam emocionais ou materiais.
São estes momentos que vão trazer a tona a forma mais íntima com a qual o outro lida com a vida. Se o casal puder continuar junto e "aguentar" o outro nestes rompantes de emoção, que muitas vezes trazem a tona agressividade, sentimentos depressivos, ansiedade extrema e muitas outras sensações de desamparo, aí sim, estará bem.
E mais ainda, se nós mesmos "aguentarmos" a exposição do nosso desespero e do nosso desamparo ao outro, que ao mesmo tempo queremos seduzir e impressionar, aí sim, teremos um relacionamento real, sem passar apenas pelos fantasmas e fantasias que colocamos nas lentes do desejo que nos aproximaram da pessoa no início.
Não conhecemos bem nem sequer a nós mesmo, então como podemos supor que conhecemos bem a um outro que vive do lado de fora de nós? Sempre vale a tentativa de conversar para tentar perceber o que o outro de fato é, caso ele queira nos mostrar.
Nestes momentos, saberemos como ele nos enxerga e poderemos ter a chance de explicar, caso ele esteja enganado sobre nós (e, geralmente, em algum aspecto ele estará) e podemos lhe dar a chance de fazer o mesmo.
Por pior que estas crises sejam, aproveite que a estabilidade que a relação tinha foi tirada, dando espaço para para aprofundar os laços entres vocês.
Tentar realmente "até o fim", ou tentar "de tudo" para "salvar" um relacionamento não é se fazer agradável para o outro, e sim se aproximar o máximo possível de si mesmo, para não nos deixar enganar de que somos o que o outro deseja e que só existimos através do olhar do outro. Isso não é verdade. O olhar do outro muitas vezes nos aprisiona em um lugar tão difícil de alcançar e tão distante do que realmente somos, que machuca e atrapalha muito a vida a dois.
Tentar "de tudo" num relacionamento é estar atento a si mesmo e é estar aberto a enxergar coisas no outro que podemos não gostar de ver, mas que temos que respeitar que faça parte dele. E, se quisermos estar junto a ele, precisaremos aceitar o que somos e que o outro aceite também. E aceitar o que o outro é e o que ele tem para oferecer, do jeito que quiser e puder oferecer. E vice versa.
Não é nada fácil, envolve relacionamentos anteriores e principalmente o nosso relacionamento com nosso próprio ser. Se nos amamos, podemos acreditar que somos amados. Se não nos amamos, desconfiaremos sempre do amor do outro por nós. E da mesma forma, isso pode acontecer ao outro, gerando infindáveis mal entendidos que poderiam ser solucionados com uma clareza maior no olhar para dentro e para fora.
A terapia pode ajudar nisso, oferecendo um olhar externo e não acostumado com os papéis que os dois ocupam na relação, questionando coisas que podem parecem imutáveis para os dois. Mas nada pode ajudar mais um casal em crise do que a comunicação franca e o olhar atento de um para o outro.
Um abraço!
Carol
carolinatorrespsicologa.blogspot.com.br
sábado, 23 de janeiro de 2016
Sobre procurar ajuda
Olá,
Saindo de uma primeira entrevista com um paciente eu sempre sinto uma sensação muito especial de poder ter acesso as fragilidades maiores de alguém. Essa sensação, por mais que a situação possa ser considerada como corriqueira em nossa profissão, não me abandona.
Nunca deixo de me emocionar, nem de me sentir de alguma forma privilegiada por ter sido escolhida por alguém para compartilhar esse segredo, essa intimidade mais profunda que é a dor dele.
Sempre saio um pouco inerte e anestesiada com a sensação de quase não respirar pela delicadeza que se faz necessária ao escutar pela primeira vez sobre esse lugar tão machucado, tão dolorido, tão escondido até do próprio paciente para si mesmo que é o que costuma vir a tona numa primeira sessão.
As coisas que são ditas ali que podem parecer banais para muitos, para nós ali são matéria prima de reflexão e base para um mergulho profundo que será feito pelo paciente e onde nós terapeutas vamos junto, no minimo como um corrimão a apoiá-lo no processo e no máximo como um colete salva vidas em casos de emergência.
Agradeço sempre pela força destas pessoas que encaram pedir ajuda e escutar a si mesmas no meio da tormenta, que é normalmente quando elas nos procuram. Sentam ali e tem coragem de se escutar, de admitir estarem perdidos dentro de si mesmos e pedem um refúgio seguro para falar sobre si, para se olharem com mais detalhes, para olharem ao espelho finalmente num lugar protegido de sua vida cotidiana.
Não é nada fácil tomar essa decisão e é por isso mesmo que nós, da área da psicologia, da psiquiatria e de outras formas de terapia ou de aconselhamento, devemos prezar sempre pela segurança emocional destas pessoas, pelo acolhimento e pela ética de não julgar de maneira alguma aquilo que ele traz, como um presente, para que possamos ajudá-lo a enxergar.
Meu respeito aos colegas que acolhem como eu estas pessoas em busca de si mesmas. E a estas pessoas corajosas que buscam a nossa ajuda, meu incentivo: vale a pena se encarar de frente e há boas pessoas por aí para ajudar! Não desistam!
Um abraço,
Carol
segunda-feira, 18 de janeiro de 2016
Perguntas
Olá,
Lanço aqui um texto meu antigo de que gosto muito.
Porquê? Como? Quando? Onde? O quê? Quem? Qual?
Nunca respostas. Sempre perguntas. Perguntas sem realmente procurar respostas.
Por que só as perguntas incluem os outros. Afirmações respondem aos outros. Afirmações são esperadas e não feitas. A não ser que peçam por elas. A não ser que haja alguém no mundo que as necessite. Se não, não.
Perto de uma resposta há sempre uma pergunta que foi feita. Ou há uma pergunta simplesmente. Uma pergunta sem resposta se o for. Uma pergunta que é revidada com outra, que é revidada com o silêncio que já é em si resposta.
Indagações são sempre novas, mesmo as velhas. Um cumprimento já é questão. O olhar já é questão. Existir já é questão. Questão de coragem, de força, de busca. Uma busca nunca é uma afirmação. Existir afirma as perguntas.
Sem elas não há nada. Questão de tempo perceber a necessidade que as respostas têm de existir enquanto campo para novas perguntas. Duas afirmações são diálogo. Uma afirmação seguida de uma negação também. Mas são perguntas que são existir. Por que há um objetivo maior atrás de todas elas. Há a necessidade de compartilhar. Há a necessidade de conectar. Com o outro, sempre com o outro. Para o outro? Ou para si mesmo? Talvez apenas com.
Muitas coisas silenciam perguntas. Mas elas existirem basta. Basta para preencher a necessidade de existir.
Sem essa coisa-outro não tem graça. E essa coisa-outro pressupõe perguntas. “Como vai?” é como dizer “como é ser você?”, “como é aí do lado de fora de mim?”, “por que é possível deste lado haver algo diferente daqui de dentro?”, “onde fica você?”, “quando é que você existiu primeiro?”, “o que é ser você?”, “quem é você?”, “o quê faz você ser você e eu ser eu?”, “que diferença faz sermos dois e não um só?”, “por que é possível eu entender que você não sou eu?”, “quer saber como é ser eu?”, “qual é esse nosso limite?”, “porque estamos perguntando?”...
Quais as perguntas, como são feitas, com que objetivo são feitas fazem parte do ser a si mesmo. Em busca de entender através do outro o que nos falta. Porque alguma coisa sempre falta. Felizmente falta, daí se pode ir buscá-las nas perguntas. Daí, não nos fechamos sobre nós mesmos. Porque não podemos.
O outro afirma a própria existência. As perguntas seguidas das respostas. O toque do outro no limite do que sou eu, que é meu corpo. Uma resposta às vezes é um toque. Um toque de acolhimento ou de recolher. O som da fala é um toque. Um toque que precede o toque físico, mas que não prescinde dele.
A voz, o som, a música entra pelo corpo do mesmo jeito que o calor do toque. E preenche uma falta, ajuda a existir e a continuar a busca. Por que precisamos perguntar quem nós somos ao outro? Por que ele saberia melhor do que nós?
E a carência de não ter um outro com a atenção voltada (ao menos parcialmente) para nós é uma carência? Ou é um sinal de saúde na busca de contorno?
O que fazer desta falta é uma pergunta. Quando ela chega todos são acionados a ajudar. “O que eu faço?”, “O que você acha que eu faço?”, “O que você faria no meu lugar?”. E ainda que nunca possamos realmente estar no lugar do outro, podemos ajudar. Podemos imaginar a partir do que o outro é como seria ser este outro. E podemos errar ao dizer a ele o que fazer. Só por que não somos ele. Mas só saber como faríamos lhe basta. Por que a pergunta foi antes “como é ser você?”. E a afirmação foi “eu te ajudo a ser você, mas só posso fazê-lo a partir de quem sou e nada mais”.
Esse limite não é transponível. Por isso existir dá angústia. A angústia é nunca ser possível uma compreensão total do outro. A angústia é não existir uma verdade que caiba a todos nós. A angústia é a missão eterna de perguntar, de decidir a partir do possível e não do certo. A tarefa é infinita e cansativa. E deve gerar prazer. Sem prazer não se continua indagando. Não se avança no questionário colossal da vida.
Um bicho não pergunta, mas ajuda a gente a formular questões. Só porque existe e não pergunta. Papo furado pensar nessas questões aqui sozinha. Tudo para perguntar mais para mim mesma e chegar ao outro com menos angústia e sabendo que ele não sabe como eu sou e que eu não sei quem ele é. E que nunca saberemos. E, por isso mesmo não paramos de tentar entender.
Por que só as perguntas incluem os outros. Afirmações respondem aos outros. Afirmações são esperadas e não feitas. A não ser que peçam por elas. A não ser que haja alguém no mundo que as necessite. Se não, não.
Perto de uma resposta há sempre uma pergunta que foi feita. Ou há uma pergunta simplesmente. Uma pergunta sem resposta se o for. Uma pergunta que é revidada com outra, que é revidada com o silêncio que já é em si resposta.
Indagações são sempre novas, mesmo as velhas. Um cumprimento já é questão. O olhar já é questão. Existir já é questão. Questão de coragem, de força, de busca. Uma busca nunca é uma afirmação. Existir afirma as perguntas.
Sem elas não há nada. Questão de tempo perceber a necessidade que as respostas têm de existir enquanto campo para novas perguntas. Duas afirmações são diálogo. Uma afirmação seguida de uma negação também. Mas são perguntas que são existir. Por que há um objetivo maior atrás de todas elas. Há a necessidade de compartilhar. Há a necessidade de conectar. Com o outro, sempre com o outro. Para o outro? Ou para si mesmo? Talvez apenas com.
Muitas coisas silenciam perguntas. Mas elas existirem basta. Basta para preencher a necessidade de existir.
Sem essa coisa-outro não tem graça. E essa coisa-outro pressupõe perguntas. “Como vai?” é como dizer “como é ser você?”, “como é aí do lado de fora de mim?”, “por que é possível deste lado haver algo diferente daqui de dentro?”, “onde fica você?”, “quando é que você existiu primeiro?”, “o que é ser você?”, “quem é você?”, “o quê faz você ser você e eu ser eu?”, “que diferença faz sermos dois e não um só?”, “por que é possível eu entender que você não sou eu?”, “quer saber como é ser eu?”, “qual é esse nosso limite?”, “porque estamos perguntando?”...
Quais as perguntas, como são feitas, com que objetivo são feitas fazem parte do ser a si mesmo. Em busca de entender através do outro o que nos falta. Porque alguma coisa sempre falta. Felizmente falta, daí se pode ir buscá-las nas perguntas. Daí, não nos fechamos sobre nós mesmos. Porque não podemos.
O outro afirma a própria existência. As perguntas seguidas das respostas. O toque do outro no limite do que sou eu, que é meu corpo. Uma resposta às vezes é um toque. Um toque de acolhimento ou de recolher. O som da fala é um toque. Um toque que precede o toque físico, mas que não prescinde dele.
A voz, o som, a música entra pelo corpo do mesmo jeito que o calor do toque. E preenche uma falta, ajuda a existir e a continuar a busca. Por que precisamos perguntar quem nós somos ao outro? Por que ele saberia melhor do que nós?
E a carência de não ter um outro com a atenção voltada (ao menos parcialmente) para nós é uma carência? Ou é um sinal de saúde na busca de contorno?
O que fazer desta falta é uma pergunta. Quando ela chega todos são acionados a ajudar. “O que eu faço?”, “O que você acha que eu faço?”, “O que você faria no meu lugar?”. E ainda que nunca possamos realmente estar no lugar do outro, podemos ajudar. Podemos imaginar a partir do que o outro é como seria ser este outro. E podemos errar ao dizer a ele o que fazer. Só por que não somos ele. Mas só saber como faríamos lhe basta. Por que a pergunta foi antes “como é ser você?”. E a afirmação foi “eu te ajudo a ser você, mas só posso fazê-lo a partir de quem sou e nada mais”.
Esse limite não é transponível. Por isso existir dá angústia. A angústia é nunca ser possível uma compreensão total do outro. A angústia é não existir uma verdade que caiba a todos nós. A angústia é a missão eterna de perguntar, de decidir a partir do possível e não do certo. A tarefa é infinita e cansativa. E deve gerar prazer. Sem prazer não se continua indagando. Não se avança no questionário colossal da vida.
Um bicho não pergunta, mas ajuda a gente a formular questões. Só porque existe e não pergunta. Papo furado pensar nessas questões aqui sozinha. Tudo para perguntar mais para mim mesma e chegar ao outro com menos angústia e sabendo que ele não sabe como eu sou e que eu não sei quem ele é. E que nunca saberemos. E, por isso mesmo não paramos de tentar entender.
Um abraço,
Carol
sexta-feira, 15 de janeiro de 2016
Afirmações
Olá,
o texto abaixo escrevi há mais de dez anos, num antigo blog, mas como gosto muito dele, resolvi repostá-lo aqui.
Algumas meninas vão a “raves”. Os garotos vão aos bares. Os músicos vão aos shows e os cineastas aos cinemas. Os gays vão aos guetos. Os namorados vão ao motel, os casados vão à casa da sogra. Os pais vão ao shopping, ao parque, vão até a escola. Todos vão ao supermercado. Todos comem e todos vão ao banheiro. Os homens vão ao masculino e podem usar o mictório. As mulheres não.
As mulheres podem engravidar, os homens não. Mas podem fazer xixi em pé. Os aleijados não. As crianças podem usar fraldas e os velhinhos também. Os jovens podem fazer piercings se os pais deixarem (se não deixarem, também).
Menores de idade podem dirigir, mas podem levar os pais para a cadeia. Adultos podem ser apaixonar por crianças e irem para a cadeia. Crianças sempre se apaixonam pelos adultos e nunca vão para a cadeia, só vão se assaltarem um adulto. Ou uma criança, ou um velhinho.
Os jovens têm mais energia sexual. Os adultos e crianças também têm. As crianças não sabem o que é “sexual”. “- Sexual é desejo, meu filho”. É querer. E querer, todo mundo quer, alguma coisa. Mesmo que não saiba o quê.
No banco, as pessoas fazem fila. No McDonald´s, no refeitório, no banheiro da balada, na entrada de casa, no dia do aniversário do amigo também. Filas se organizam para que todos tenham sua vez. Mais, ou menos, as filas funcionam. Às vezes elas falham e as pessoas não podem ter cada uma a sua vez. Algumas pessoas furam as filas.
Homens, mulheres, crianças e velhinhos se olham no espelho. Os cegos não olham. Todos ouvem música. Os surdos não ouvem nada. Alguns se reconhecem no espelho. Alguns psicóticos não se reconhecem, nem dentro, nem fora do espelho. Nem os bebês. Os bebês não entendem muitas coisas. Vão entendendo bem devagarinho. Ou achando que entenderam. E depois descobrem que entenderam tudo errado e começam a entender tudo de novo. Às vezes certo, às vezes errado, de novo. E às vezes nunca entendem nada. Às vezes morrem. Até os bebês morrem. E ninguém gosta de pensar nisso, mas que eles morrem, eles morrem. Por que quando há alguma coisa errada ou há um acidente alguém pode morrer. E um bebê é muito frágil (por que não entende nada) e morre ainda mais rápido do que uma criança, um homem, uma mulher ou um velhinho.
Às vezes se morre quando não há nada errado. É preciso que haja sempre pelo menos alguma coisa errada. Para não morrermos. Não morrer é quando a gente sabe que está vivo. Se a gente não sabe, a gente morre. Sem querer.
E geralmente não se quer morrer. Raras vezes se pensa que se quer, mas em geral é mentira. Pode ser uma desesperança. Uma preguiça de viver, ou uma angústia maior do que se está conseguindo suportar naquela hora. Às vezes é genuína essa vontade e se morre mesmo. Algumas pessoas se suicidam nessa hora. E nunca podemos saber porque o fizeram, porque elas não voltam para nos explicar. E nós ficamos bravos, curiosos, tristes, ou com vontade de fazer igual, mas nem sempre fazemos.
Amor e morte estão muito próximos, dizem. Dizem que o ápice do sexo é uma sensação que podemos comparar à da morte. Como podemos comparar algo à morte se nunca morremos antes? Nunca morremos e falamos sobre como é a morte, como se pudéssemos metaforizá-la. E podemos. Podemos metaforizar qualquer coisa. Pra isso servem as metáforas. E pode ser que elas sirvam para alguma coisa, por exemplo, para nos fazer pensar na morte de um jeito menos desconhecido como olhávamos antes de metaforizá-la. Pelo menos serve pra escrever um texto como esse. E não chegar a conclusão nenhuma.
Um abraço,
Carol
segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
Gratidão e redirecionamentos de energia
Olá,
É comum nesta época do ano termos algum tempo para refletir sobre o ano que se passou e sobre as conquistas e avanços que a vida nos trouxe, nos ajudando até a traçar metas que ainda não realizamos para o ano que está por vir.
Vale a pena fazer um balanço daquilo que aconteceu e pensar com calma nas coisas que foram fruto de um projeto de longo prazo e do esforço em mudar atitudes e comportamentos diante das situações e do que não houve controle e que, mesmo assim, pode ser encarado de alguma forma por você trazendo crescimento ou aprendizado.
Todas as situações pelas quais passamos pode nos ensinar alguma coisa. Mas é comum haver uma dificuldade em reconhecer uma situação como fonte de aprendizagem quando ela também promove muita ansiedade ou angústia.
Neste sentido, é importante estarmos sempre muito conectados a nos mesmos, pesando se a situação nos cabe, se podemos ajudar mesmo ou se não há o que fazer a respeito. É muito comum gastarmos uma energia imensa levando nas costas problemas que não nos cabem resolver ou projetos que não fomos nós que idealizamos para a nossa vida.
Para o ano que se inicia, desejo que todos nós possamos olhar mais para nós mesmos, conseguindo diferenciar entre pesos que podemos e que não podemos e nem devemos carregar, liberando assim energia para ser investida em nós mesmos e nos projetos que idealizamos ou idealizaremos, fazendo sentido para nós.
Direcione sua energia para dentro, conheça e cuide mais de você, pois assim, mais inteiro, você poderá ter mais clareza e tranquilidade para oferecer compaixão e apoio aos outros a sua volta, à sua maneira.
Tenho este blog já há três anos, mas foi só em julho deste ano que consegui começar a direcionar energia pessoal a ele e começar a escrever mais textos autorais e não apenas divulgar eventos gratuitos na psicologia e na educação que pesquisava em outros blogs. Precisei de coragem para me expor e fui muito bem recebida e, por isso, agradeço de coração ao apoio, aos comentários incentivadores e a todos que participam ou participaram de alguma forma deste espaço de reflexão. Muito obrigada!
Desejo um ano novo mais doce para vocês e para o seus amores!
Um abraço,
Carol
terça-feira, 20 de outubro de 2015
Crianças no Controle: Mudanças na estrutura familiar e a crise na autoridade dos pais
Olá,
Transcrevo a seguir uma matéria minha que saiu na Revista "Grandes Temas de Conhecimento: Psicologia" Número 19, publicada pela Mythos Editora, em Maio de 2015.
ALGO ACONTECEU NAS
RELAÇÕES ENTRE PAIS, ADULTOS EM GERAL, E AS CRIANÇAS, QUE DESAUTORIZA OS
ADULTOS DE DAREM “ORDENS” OU MESMO LIMITES AOS PEQUENOS, MÉDIOS E GRANDES
FILHOS.
Nesse artigo, vou destacar o papel da cultura e das mudanças sociais e
materiais como uma fonte de influência na mudança do lugar de autoridade dos
pais em relação às crianças e na presença de outras instâncias moderadoras da
relação entre os pais e os filhos que atravessam esse deslocamento de papéis.
Pretendemos,
também, traçar um campo para refletir as alterações subjetivas, não só em
relação aos filhos, mas em relação aos projetos pessoais dos sujeitos, que acabam
se refletindo no desejo de serem pais. O conceito de autoridade se define por: “1.
Direito ou poder de se fazer obedecer, de dar ordens, de tomar decisões, de
agir, etc. 2. Aquele que tem tal direito ou poder. 3. Os órgãos do poder
público. 4. Aquele que tem por encargo fazer respeitar as leis; representante
do poder público. 5. Domínio, jurisdição. 6. Influência, prestígio; crédito. 6.
Indivíduo de competência indiscutível, em determinado assunto”. Essa definição
do Dicionário Aurélio, nos ajuda a entender o que constitui o conceito
de autoridade, que vamos abordar no sentido de seu declínio.
A escola
passou a ser responsável por transmitir o que antes era adquirido por meio do
convívio familiar, como as “boas” maneiras, princípios morais e até educação
sexual.
Christopher Lasch, em seu livro A
cultura
do narcisismo, discute essas
questões
no contexto norte-americano. Vamos
utilizar
suas reflexões considerando que a
cultura
norte-americana acabou por influenciar
os
modos de produção e, consequentemente,
de
subjetivação no mundo ocidental. Lasch
pensa
na reprodução humana como na
reprodução
da força de trabalho. Tanto a
reprodução
em si, quanto os cuidados em relação
aos
jovens, sempre estiveram centrados no
seio
da família, porém o sistema de
socialização
da produção, ou seja, a produção em
massa,
também chamada “industrialização”,
acabou
se apropriando também desses aspectos
e das
funções socializadoras do lar que,
após a II
Revolução Industrial,
foram colocadas sob a
alçada do
Estado.
O que
anteriormente era adquirido por
meio do
convívio com os familiares, passou a
ser
recebido pela escola: “boas” maneiras, princípios
morais e
até educação sexual. Mudanças
sociais,
políticas e industriais fizeram com que
a escola
assumisse responsabilidades antes assumidas
pelo lar,
como o treinamento físico,
mental e
social. Na república social, a criança
é vista
como um futuro cidadão e, portanto, é
responsabilidade
do Estado, e não de seus pais.
Seu
bem-estar é de interesse do Estado, que
deve
evitar os danos que os pais possam causar
a seus filhos.
E aqui, o acesso do Estado a essas
crianças
se dá por meio da escola, que assume,
nessa
política, o papel de autoridade máxima
em
relação aos filhos. O Professor passa a ser
Educador.
Os
trabalhadores, pais dessas crianças,
são
postos de lado e obrigados a trabalhar
para o
Estado. O bem-estar de seus filhos é
“garantido”
por essas instituições substitutas
e não há
opção, pois o Estado coloca-se como
responsável
por eles, em nome de um desenvolvimento
saudável
para essas crianças, visando ao bem da sociedade,
como um
todo.
O
trabalho infantil foi proibido e a custódia
da
criança era dada à escola. O Estado via
nos lares
desfeitos uma fonte de jovens delinquentes
e
ameaçadores. A autoridade dos
pais
sobre seus filhos dependia, agora, do desejo
de esses
pais em cooperar e em obedecer
aos
tribunais de menores, caso contrário,
as
competências do sujeito, como pai, seriam
questionadas
e a convivência com sua prole
impedida.
O movimento
por melhorias do lar possui grandes
contradições,
pois, ao mesmo tempo em que instrui
os pais
no cuidado com os filhos, dá as costas a esses
pais e
toma essa função para si.
Os
reformistas concordavam que a família
promovia
uma mentalidade restrita e
desfavorável
ao desenvolvimento da criança,
levando-os
a supor que agentes externos
deveriam
substituí-la para o bem da criança.
Agentes,
inventados para assumir o papel dos
pais que
fossem considerados inadequados,
passaram
a educar e formar as crianças, sob
a tutela
do Estado.
Nesse
contexto, diz Lasch, surgiu também
a chamada
“educação de pais”, promovida
pelo
Estado por agentes especializados na
criação
de crianças, para gerar melhorias
na
qualidade do cuidado dado à criança na
família.
A escola assumiu um papel mais extenso
– o de
cultivar na criança a socialização
fora do
âmbito familiar.
O
movimento pela melhoria do lar
passou
por contradições enormes, pois, ao
mesmo
tempo em que buscava instruir os
pais nos
cuidados a serem dados aos filhos,
dava as
costas a esses mesmos pais, tomando
a frente
nessa função. Esse movimento, que
surgiu
como parte de um esforço mais amplo
de
civilizar as massas, atingiu o cerne da estrutura
familiar,
desautorizando maciçamente
os pais,
em sua relação com os filhos.
Segundo
Lasch, especialistas de diversos
campos
incidiam sobre a família e retiravam
as
crianças dos lares ditos “impróprios”,
impondo
substitutos às figuras parentais. Percebiam,
porém,
que apesar dessas ações, as
crianças
continuavam “fiéis” aos pais de origem.
Começou-se,
então, a pensar que aquelas
famílias,
consideradas desestruturadas e
ameaçadoras
para as crianças, ofereciam a
elas algo
que o lar adotivo não podia dar .
A ideia,
então, tornou-se “salvar” não
mais a
criança isoladamente, mas toda a família
“desestruturada”,
buscando, também, um
modo de
civilizar as massas. Os médicos passaram
a atacar
os métodos tradicionais de cuidado
com as
crianças. Tiravam aos poucos a
confiança
dos pais em relação à sua capacidade
de cuidar
de seus filhos e iam colocando-se
no meio
do caminho, com seus conhecimentos
técnicos
supostamente mais adequados.
Com o
advento das novas formas de
controle
de natalidade, os pais se liberaram
da carga
de criar filhos indesejados, mas, ao
mesmo
tempo, surgia-lhes uma espécie de
obrigação
de fazer com que os seus filhos se
sentissem
desejados o tempo inteiro.
Nos anos
1940, a ideia contrária à anteriormente
defendida
pelos especialistas aparece:
agora, os
pais deveriam voltar a confiar
em seus
instintos, no que diz respeito à
criação
dos filhos. Os especialistas se deram
conta de
que seus conselhos haviam minado
a
confiança dos pais e chegaram à conclusão
de que
não deveriam culpar exclusivamente
aos pais
pelas faltas de seus filhos.
Os pais
modernos confiam numa forma prescrita
pelos
especialistas para criar seus filhos como os
“vencedores”
que a sociedade exige.
No
discurso dos pais, aparecia a sensação
de ter
falhado em desempenhar o seu papel
como os
seus próprios pais haviam feito,
sem saber
o que poderiam ter feito diferente.
Esses
pais temiam repetir os erros de seus
pais e, por
isso, a opinião dos especialistas
virou
regra de conduta na criação. O antigo
modelo de
autoritarismo era abominado entre
os pais
modernos e a permissividade era
agora
mais comum.
A
desvalorização da paternidade, segundo
Lasch,
veio dessa transferência de funções
da
família para organizações especializadas.
As
habilidades técnicas, que o mundo
industrializado
exige dos profissionais, fazem
com que
os pais tenham muito pouco o que
levar do
cotidiano de seu trabalho para os filhos,
além do
amor. Essa situação promove
uma
separação, cada vez maior, entre o mundo
do adulto
e o da criança, e dificulta, cada
vez mais,
as identificações psicológicas fortes
dos
filhos com seus pais.
Os pais
modernos confiaram em um
jeito
prescrito pelos tais especialistas para
lidar com
seus filhos e têm um compromisso
com uma
ideia de parentalidade perfeita
– criar
os filhos “vencedores” que a sociedade
contemporânea
exige. O sentimento parental
não é
espontâneo, mas idealizado, e o cuidado
que os
pais têm para com esses filhos é
exagerado,
mecânico, sufocante e esvaziado
do
investimento libidinal genuíno.
A atenção
da mãe apoia-se tão fortemente
na visão
dos especialistas, que não
passa a
sensação de segurança aos filhos.
Ambos os
pais buscam, na família, um refúgio
ao mundo
externo, que julgam ameaçador. O
que eles
não percebem é que os padrões familiares
são
oriundos, e constantemente reforçados,
pelas
condições externas. Segundo
Lasch, o
declínio da autoridade parental reflete
o
declínio do superego na sociedade, ou
seja, uma
diminuição da função paterna, que
dá
limite, protege e breca os instintos nos filhos,
criando
uma geração sem autodomínio
e sem
freio, permissiva, que vive em função
dos
prazeres do consumo exagerado.
Voltamos
aqui a pensar que as mudanças
na
família levaram a uma mudança no
conteúdo
do superego, pois, com o fracasso
da
autoridade dos pais, o superego dos filhos
mantém-se
colado às imagens arcaicas dos
pais, ou
seja, esse superego permanece punitivo
e severo
sem flexibilização. Um clima
social de
permissividade com um superego
severo
como aquele da infância, resulta num
descontentamento
e em modos depressivos
de
subjetividade.
A
abdicação da autoridade parental
intensifica,
ao invés de diminuir, o medo de
punição
que a criança tem, porque suscita
pensamentos
de punição muito severos, daquela
fase
primitiva. As experiências com a
autoridade
externa complementam o treinamento
do
cidadão, mas o controle social não
promove
uma alteração no superego primitivo.
Coisa que
só acontece nas relações familiares,
onde o vínculo
é supostamente incondicional,
o que
significa que independe
de um
comportamento bom ou mal, mas que
é
atravessado por eles e pelas consequências
deles.
Vemos,
assim, que a evolução da sociedade
pós-Segunda
Revolução Industrial
reformulou
padrões de convívio familiar e
de
condutas parentais por meio da especialização
dos
cuidados com a criança e do afas-
tamento
dos pais da convivência com seus
filhos. A
ampliação da jornada de trabalho e
a
retirada da responsabilidade da família em
relação à
educação e à socialização primária
das
crianças tiveram um enorme efeito de
desvalorização
da autoridade parental que
abalou a
autoconfiança dos pais como cuidadores
efetivos
de sua prole.
“Este
movimento de dar o controle às crianças, porém não é sem retorno, muito pelo
contrário, já tem sido alterado e questionado pelas famílias e pela nova
geração de profissionais que auxiliam e trabalham em parceria com estas
famílias.”
Esse
movimento de dar o controle às
crianças,
porém, não é sem retorno, muito
pelo
contrário, já tem sido alterado e questionado
pelas
famílias e pela nova geração de
profissionais
que auxiliam e trabalham em
parceria
com essas famílias. Os novos pais
procuram
mudar a natureza de suas relações,
colocar-se
novamente como aqueles que sabem
o que
deve ou não acontecer na conduta
de seus
filhos e nas relações com eles, ainda
que com
muito custo e com dúvidas e algumas
vezes
questionando-se de estar fazendo
a melhor
coisa, o que é comum que aconteça
depois de
tanto tempo de questionamento sobre
sua
própria condição em tomar as rédeas
da
educação moral de seus filhos.
É
imprescindível que os pais possam
reaver
seus direitos parentais e terem dessa
maneira a
possibilidade de se relacionar de
forma
mais saudável com seus filhos, sem
modo de lhes
dar o limite, limite este que é
fundamental
e fundante para gerar crianças
e
adolescentes que possam vir a se tornar
adultos
seguros, confiantes e felizes, por
terem nos
pais e responsáveis esse espelho
de
segurança, de alguém que não lhes deixe
de colocar
em risco, que lhes promova o
acolhimento
e também a cobrança, a briga e
a bronca
quando estiverem ultrapassando e
testando
esses limites. Só assim as crianças
terão a
confiança no adulto que cuida dela,
que ela
sabe, que, com falhas e problemas,
sempre
fará o possível para mantê-la segura
e dentro
de um sistema de valores consistente,
seja ele
baseado no que for, mas que faça
sentido
para aquele núcleo familiar, ou, pelo
menos,
para aquela parceria mãe/filho(a) ou
pai/filho(a).
*
Carolina Torres é psicóloga clínica e professora em
Educação
Infantil, graduada em Psicologia pela Pontifícia
Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP),
em
2005, com especialização em:
Teoria
Psicanalítica pela Coordenadoria Geral de Especialização,
Aperfeiçoamento
e Extensão Universitária
(COGEAE)
da mesma instituição, em 2009;
Pedagogia
pela Universidade Estadual Paulista
(UNESP),
em 2013;
Ética,
Valores e Cidadania pela Universidade de São
Paulo
(USP), em 2014
Um abraço,
Carol
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