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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Como sobreviver à separação



Na semana passada falei sobre a crise como uma oportunidade na relação, como pode acontecer no caso de um casal que decida encarar um ao outro mesmo com suas diferenças e medos e que decidam finalmente ficarem juntos.

Mesmo assim, é preciso pensar no pior, que muitas vezes acontece, de haver um separação de fato. Não há uma forma ideal de lidar com isso e muito menos um motivo apenas para um casal decidir se afastar.

Nem sempre é um decisão de ambos os lados, quase nunca é algo que possa ser elaborado com facilidade e pode ser por diversos motivos, alguns menos dolorosos, como um desentendimento e um afastamento gradual pelos dois lados irem se diferenciando muito um do outro e mudando a forma como encaram a vida e a si mesmo, e consequentemente o outro. Outros são mais dolorosos, como o apaixonamento de uma das partes por outra pessoa, com ou sem uma traição real. 

De qualquer maneira, apesar da imensa falta que uma pessoa possa sentir da outra após a separação, a elaboração dos motivos dela são uma das parte mais dolorosas e inevitáveis. Pensar o que poderia ter sido feito ou dito de outra forma e reviver milhares de vezes conversas e diálogos imaginários desgastam e geram muita angústia, mas ajudam a elaboração ser concluída, quando não podem ocorrer na realidade com a pessoa real por raiva, rancor, ou por outros motivos. 

Ums parte muito difícil nos casos de separações não amigáveis é quando existem filhos ou animais de estimação que sejam dos dois, em que a convivência pode ser muito diminuída ou eliminada, gerando a chamada alienação parental, muito dolorosa para a parte que acaba sem a guarda ou sem o direito de visita, numa separação mais agressiva, além de gerar muito sofrimento à criança ou animal.

A outra parte a ser elaborada e que merece nossa atenção, por parecer menos comentada pelas pessoas neste tema, é a redefinição de papéis a serem exercidos no mundo. 

Muitos de nós somos criados para nos casar e formar uma família. Quando um casamento acontece encarnamos num papel que idealizamos para nós mesmos a partir do desejo de quem nos criou e da introjeção destes valores que nos levam a querer ser parte de uma instituição familiar tradicional e estável. Na realidade, esse modelo não é o único a ser seguido e nem sequer o melhor. Podemos nos relacionar da forma como quisermos e temos o direito de errar e de tentar outras vezes até decidirmos se queremos ou não o modelo apresentado, criando o nosso próprio modo de viver em casal ou fora dele, se assim preferirmos. 

Porém, como esta pressão social e familiar é muito intensa, quando um casamento se rompe, acontece uma desestruturação muito mais profunda do que apenas a material, de dissolução de um lar, que já é muito dolorosa e simbólica. Acontece a pior parte que é a desestruturação de um papel social e pessoal que assumimos neste lugar "ideal" (por pior que a relação estivesse antes da separação). 

Este papel que se encaixa muito confortavelmente por ser o que esperam de nós, é o papel de esposa ou de marido, de namorada ou companheira, de parceira, enfim, de acompanhada. Para as mulheres, por muitos anos, o papel de esposa de alguém foi o único papel aceitável e respeitável numa sociedade e sofremos o ranço destas concepções de mulher. Mesmo assim, para os homens não é fácil deixar o papel de marido ou de provedor rompendo também com um papel esperado e cheio de significados e pressão. 

Quando a separação se dá e é finalmente decidida, não é nada fácil pelas possíveis saudades reais do companheiro, mas principalmente pelo luto deste papel idealizado que nos dá uma identidade confortável no mundo. 

Nos acostumamos a ser "a esposa de fulano" ou "o marido de ciclana" e dependendo da duração desta relação e de suas raízes em nossa psique, não conseguimos nos enxergar como nenhuma outra coisa, mesmo tendo muitas outras funções e papéis no mundo em outras relações. Nos sentimos esvaziados de sentido, desconhecemos outro papel a exercer nas relações com as pessoas sem aquele papel que julgávamos principal. 

A maior dor e o lugar que mais precisa ser trabalhado é esse: como viver sem o olhar do outro? Como viver sem o papel que se exercia naquela relação? Como ser alguém sem ser para agradá-lo? Como pensar em atividades cotidianas que não incluam a presença dele?

Não é simples, mas é importante pensar que antes de conhecermos esta pessoa, já existíamos, já havia vida antes da pessoa chegar e, do mesmo modo, é preciso se esforçar muitas vezes para pensar nisso, mas haverá uma vida após a pessoa sair de nossa vida como parceiro. 

Não precisamos de um parceiro amoroso para viver. Podemos viver sem ele. E, além de tudo, para ter uma relação mais saudável possível da próxima vez, é importante se lembrar de não precisar do outro, pois quando precisamos, a relação não funciona bem. É imprescindível que a gente saiba que não precisa do outro para viver bem na relação, com ele ao lado, como uma companhia desejada, mas nunca com uma muleta. É preciso andar com as próprias pernas e deixar que o outro ande com as dele, daí sim, tê-lo ao lado para caminhar o caminho dele, ao seu lado, mas não por você.

A fantasia de amor romântico e apaixonado que mistura as almas dos amantes e que faz esta ideia de cara-metade, tampa-da-panela ou metade-da-laranja não facilita para pensarmos numa relação boa e real, mas sim numa simbiose que não se sustenta após a real aproximação entre as pessoas, pois se baseia na ilusão do apaixonamento que dura pouco e não faz jus ao que uma relação é. 

Deste modo, vale a pena tentar retomar sua personalidade, com os ganhos e aprendizados que a relação lhe trouxe para o bem e para o mal e seguir adiante tentando, se for o caso, não repetir os mesmos erros na próxima vez.

Os papéis não precisam se perder junto com a relação, mas se reconfigurar e serem re-significados para a nova fase da vida que surge após o término e nas novas relações que forem surgindo.

Há vida após a separação e ela pode ser boa e feliz!

Um abraço, 
Carol
carolinatorrespsicologa.blogspot.com.br