quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Crises como oportunidades no relacionamento



Olá, 

Nesta semana quero falar sobre as relações amorosas. Não é nada raro em consultório sermos procuradas em momentos de crise de relacionamento afetivo.

Normalmente acontece de uma pessoa estar com muito medo de perder a outra e de ficar sozinha. Ou então, há fantasias sobre o desejo do outro por outras pessoas que não ela. Ou ainda há uma insatisfação com o que o outro oferece na relação que não é suficiente ou não está de acordo com o que pessoa espera dele.

Em relacionamentos afetivos, vejo um caminho sempre semelhante, pois apesar de cada caso acontecer dentro de um contexto completamente diferente e particular, o que acontece é sempre um apaixonamento.

A principio não sabemos o que é o outro, não conhecemos o outro, e na paixão colocamos nele aquilo que mais queremos em alguém, na idealização que temos de um relacionamento que provem das relações que observamos na vida real (de nosso pais, tios, avós, etc) e do que vemos no ambiente ficcional, da fantasia (filmes, livros, séries, desenhos, etc) e vamos formando uma ideia do que é um relacionamento e de como queremos o nosso.

O que vemos no outro, nem sempre, ou, quase nunca, é o que ele é de verdade. Vemos uma possibilidade de parceria com uma ideia de um outro. Ao longo de um relacionamento de longo prazo, vemos o outro e tentamos encaixá-lo nessa nossa fantasia, mas, aos poucos, esse outro vai se tornando real e isso pode ser muito assustador.

O outro também faz isso conosco e pode ter momentos em que percebe coisas em nós que não estava "em seus planos" (da fantasia) e que pode fazê-lo ter medo e se questionar, gerando uma crise. 

Normalmente, em casamentos estáveis e longos, essas crises vêm junto com uma crise real, seja uma doença, um acidente na família, uma questão financeira grave, entre outras coisas que abalam o dia a dia e a forma de viver a qual o casal se acostumou. 

É comum, por exemplo, num casal em que alguém sempre toma as decisões e organiza a vida doméstica ou financeira, que quando esta pessoa fica fragilizada ou não pode cuidar das coisas, o outro que não está acostumado a fazer isso, se sinta mal, sobrecarregado ou aflito por ver fragilidade no outro quando este era seu porto seguro. 

Não há receita de como devem ser as relações e estes papéis vão sendo decididos silenciosamente, sem sabermos que somos, por exemplo, o provedor, ou o porto seguro do outro, mas nos tornamos e nos habituamos aos variados papéis que vão sendo atribuídos de um para o outro. 

Quando isto acontece, a crise pode vir caso estes papéis precisem se movimentar e isso pode mexer em fantasias muito antigas no relacionamento entre os dois e também do relacionamento de cada umas das pessoas com si mesmas e outras pessoas com as quais se relacionaram antes. 

Não é possível saber como lidar com isso de uma forma geral, pois cada um tem uma historia de vida. Mas é possível perceber o seu lugar numa relação e, se está em crise, tentar ver que parte desta crise pertence a você mesmo, o que você está cobrando do outro que na verdade não deveria cobrar. O que incomoda mais em você mesmo na relação é só o que você pode mudar. E é sempre, sempre, sempre bom conversar e tentar entender o ponto de vista do outro, para ver que nem tudo é como você imaginava e que talvez, vocês ainda não se conheçam bem.

Não é muito fácil conhecer o outro mesmo morando com ele, tendo filhos com ele, passando a vida juntos. O momento mais fácil de conhecer o outro é o momento de crise. Onde a fragilidade traz emoções a flor da pele e aí sim você sabe com quem está lidando. Não é nada fácil ficar doente, perder alguém importante da família, ter um filho doente, ter dificuldade de engravidar, sofrer um acidente, perder o emprego ou passar por outras necessidades básicas, sejam emocionais ou materiais.

São estes momentos que vão trazer a tona a forma mais íntima com a qual o outro lida com a vida. Se o casal puder continuar junto e "aguentar" o outro nestes rompantes de emoção, que muitas vezes trazem a tona agressividade, sentimentos depressivos, ansiedade extrema e muitas outras sensações de desamparo, aí sim, estará bem. 

E mais ainda, se nós mesmos "aguentarmos" a exposição do nosso desespero e do nosso desamparo ao outro, que ao mesmo tempo queremos seduzir e impressionar, aí sim, teremos um relacionamento real, sem passar apenas pelos fantasmas e fantasias que colocamos nas lentes do desejo que nos aproximaram da pessoa no início. 

Não conhecemos bem nem sequer a nós mesmo, então como podemos supor que conhecemos bem a um outro que vive do lado de fora de nós? Sempre vale a tentativa de conversar para tentar perceber o que o outro de fato é, caso ele queira nos mostrar. 

Nestes momentos, saberemos como ele nos enxerga e poderemos ter a chance de explicar, caso ele esteja enganado sobre nós (e, geralmente, em algum aspecto ele estará) e podemos lhe dar a chance de fazer o mesmo. 

Por pior que estas crises sejam, aproveite que a estabilidade que a relação tinha foi tirada, dando espaço para para aprofundar os laços entres vocês. 

Tentar realmente "até o fim", ou tentar "de tudo" para "salvar" um relacionamento não é se fazer agradável para o outro, e sim se aproximar o máximo possível de si mesmo, para não nos deixar enganar de que somos o que o outro deseja e que só existimos através do olhar do outro. Isso não é verdade. O olhar do outro muitas vezes nos aprisiona em um lugar tão difícil de alcançar e tão distante do que realmente somos, que machuca e atrapalha muito a vida a dois. 

Tentar "de tudo" num relacionamento é estar atento a si mesmo e é estar aberto a enxergar coisas no outro que podemos não gostar de ver, mas que temos que respeitar que faça parte dele. E, se quisermos estar junto a ele, precisaremos aceitar o que somos e que o outro aceite também. E aceitar o que o outro é e o que ele tem para oferecer, do jeito que quiser e puder oferecer. E vice versa. 

Não é nada fácil, envolve relacionamentos anteriores e principalmente o nosso relacionamento com nosso próprio ser. Se nos amamos, podemos acreditar que somos amados. Se não nos amamos, desconfiaremos sempre do amor do outro por nós. E da mesma forma, isso pode acontecer ao outro, gerando infindáveis mal entendidos que poderiam ser solucionados com uma clareza maior no olhar para dentro e para fora. 

A terapia pode ajudar nisso, oferecendo um olhar externo e não acostumado com os papéis que os dois ocupam na relação, questionando coisas que podem parecem imutáveis para os dois. Mas nada pode ajudar mais um casal em crise do que a comunicação franca e o olhar atento de um para o outro.

Um abraço!
Carol
carolinatorrespsicologa.blogspot.com.br

sábado, 23 de janeiro de 2016

Sobre procurar ajuda

Olá, 

Saindo de uma primeira entrevista com um paciente eu sempre sinto uma sensação muito especial de poder ter acesso as fragilidades maiores de alguém. Essa sensação, por mais que a situação possa ser considerada como corriqueira em nossa profissão, não me abandona. 

Nunca deixo de me emocionar, nem de me sentir de alguma forma privilegiada por ter sido escolhida por alguém para compartilhar esse segredo, essa intimidade mais profunda que é a dor dele.



Sempre saio um pouco inerte e anestesiada com a sensação de quase não respirar pela delicadeza que se faz necessária ao escutar pela primeira vez sobre esse lugar tão machucado, tão dolorido, tão escondido até do próprio paciente para si mesmo que  é o que costuma vir a tona numa primeira sessão.



As coisas que são ditas ali que podem parecer banais para muitos, para nós ali são matéria prima de reflexão e base para um mergulho profundo que será feito pelo paciente e onde nós terapeutas vamos junto, no minimo como um corrimão a apoiá-lo no processo e no máximo como um colete salva vidas em casos de emergência.

Agradeço sempre pela força destas pessoas que encaram pedir ajuda e escutar a si mesmas no meio da tormenta, que é normalmente quando elas nos procuram. Sentam ali e tem coragem de se escutar, de admitir estarem perdidos dentro de si mesmos e pedem um refúgio seguro para falar sobre si, para se olharem com mais detalhes, para olharem ao espelho finalmente num lugar protegido de sua vida cotidiana. 

Não é nada fácil tomar essa decisão e é por isso mesmo que nós, da área da psicologia, da psiquiatria e de outras formas de terapia ou de aconselhamento, devemos prezar sempre pela segurança emocional destas pessoas, pelo acolhimento e pela ética de não julgar de maneira alguma aquilo que ele traz, como um presente, para que possamos ajudá-lo a enxergar.

Meu respeito aos colegas que acolhem como eu estas pessoas em busca de si mesmas. E a estas pessoas corajosas que buscam a nossa ajuda, meu incentivo: vale a pena se encarar de frente e há boas pessoas por aí para ajudar! Não desistam!

Um abraço, 
Carol

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Perguntas

Olá, 


Lanço aqui um texto meu antigo de que gosto muito. 

Porquê? Como? Quando? Onde? O quê? Quem? Qual?

Nunca respostas. Sempre perguntas. Perguntas sem realmente procurar respostas.
Por que só as perguntas incluem os outros. Afirmações respondem aos outros. Afirmações são esperadas e não feitas. A não ser que peçam por elas. A não ser que haja alguém no mundo que as necessite. Se não, não.
Perto de uma resposta há sempre uma pergunta que foi feita. Ou há uma pergunta simplesmente. Uma pergunta sem resposta se o for. Uma pergunta que é revidada com outra, que é revidada com o silêncio que já é em si resposta.
Indagações são sempre novas, mesmo as velhas. Um cumprimento já é questão. O olhar já é questão. Existir já é questão. Questão de coragem, de força, de busca. Uma busca nunca é uma afirmação. Existir afirma as perguntas.
Sem elas não há nada. Questão de tempo perceber a necessidade que as respostas têm de existir enquanto campo para novas perguntas. Duas afirmações são diálogo. Uma afirmação seguida de uma negação também. Mas são perguntas que são existir. Por que há um objetivo maior atrás de todas elas. Há a necessidade de compartilhar. Há a necessidade de conectar. Com o outro, sempre com o outro. Para o outro? Ou para si mesmo? Talvez apenas com.
Muitas coisas silenciam perguntas. Mas elas existirem basta. Basta para preencher a necessidade de existir.
Sem essa coisa-outro não tem graça. E essa coisa-outro pressupõe perguntas. “Como vai?” é como dizer “como é ser você?”, “como é aí do lado de fora de mim?”, “por que é possível deste lado haver algo diferente daqui de dentro?”, “onde fica você?”, “quando é que você existiu primeiro?”, “o que é ser você?”, “quem é você?”, “o quê faz você ser você e eu ser eu?”, “que diferença faz sermos dois e não um só?”, “por que é possível eu entender que você não sou eu?”, “quer saber como é ser eu?”, “qual é esse nosso limite?”, “porque estamos perguntando?”...
Quais as perguntas, como são feitas, com que objetivo são feitas fazem parte do ser a si mesmo. Em busca de entender através do outro o que nos falta. Porque alguma coisa sempre falta. Felizmente falta, daí se pode ir buscá-las nas perguntas. Daí, não nos fechamos sobre nós mesmos. Porque não podemos.
O outro afirma a própria existência. As perguntas seguidas das respostas. O toque do outro no limite do que sou eu, que é meu corpo. Uma resposta às vezes é um toque. Um toque de acolhimento ou de recolher. O som da fala é um toque. Um toque que precede o toque físico, mas que não prescinde dele.
A voz, o som, a música entra pelo corpo do mesmo jeito que o calor do toque. E preenche uma falta, ajuda a existir e a continuar a busca. Por que precisamos perguntar quem nós somos ao outro? Por que ele saberia melhor do que nós?
E a carência de não ter um outro com a atenção voltada (ao menos parcialmente) para nós é uma carência? Ou é um sinal de saúde na busca de contorno?
O que fazer desta falta é uma pergunta. Quando ela chega todos são acionados a ajudar. “O que eu faço?”, “O que você acha que eu faço?”, “O que você faria no meu lugar?”. E ainda que nunca possamos realmente estar no lugar do outro, podemos ajudar. Podemos imaginar a partir do que o outro é como seria ser este outro. E podemos errar ao dizer a ele o que fazer. Só por que não somos ele. Mas só saber como faríamos lhe basta. Por que a pergunta foi antes “como é ser você?”. E a afirmação foi “eu te ajudo a ser você, mas só posso fazê-lo a partir de quem sou e nada mais”.
Esse limite não é transponível. Por isso existir dá angústia. A angústia é nunca ser possível uma compreensão total do outro. A angústia é não existir uma verdade que caiba a todos nós. A angústia é a missão eterna de perguntar, de decidir a partir do possível e não do certo. A tarefa é infinita e cansativa. E deve gerar prazer. Sem prazer não se continua indagando. Não se avança no questionário colossal da vida.
Um bicho não pergunta, mas ajuda a gente a formular questões. Só porque existe e não pergunta. Papo furado pensar nessas questões aqui sozinha. Tudo para perguntar mais para mim mesma e chegar ao outro com menos angústia e sabendo que ele não sabe como eu sou e que eu não sei quem ele é. E que nunca saberemos. E, por isso mesmo não paramos de tentar entender.

Um abraço, 
Carol

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

O fenômeno "Jout Jout" e o poder da empatia na internet


Olá, 

Escrevo hoje para comentar sobre uma vlogueira chamada "Jout Jout", na verdade Julia, uma carioca de 24 anos que começou a postar videos no YouTube sobre temas variados, buscando se livrar da vergonha que tinha em mostrar suas produções aos outros.

O canal chamado "Jout Jout Prazer", versa sobre quaisquer temas que passem pela cabeça dela, aliado também a temas sugeridos por seus fãs, a auto intitulada "Família Jout Jout". A exposição que mais chamou atenção do público foi a "destabulização" de temas como os relacionamentos abusivos, questões relacionadas à sexualidade, masturbação, ao uso de coletor menstrual, ao abuso sexual, ao machismo, racismo, homofobia, entre outros temas cotidianos mais banais dos quais ela fala com total desprendimento. 

O que mais me chama atenção é a forma absolutamente livre e a vontade com que Julia se apresenta diante das câmeras. A vlogueira é uma garota de classe média de Niterói, no Rio de Janeiro, que fala das suas opiniões sobre séries, relacionamentos, sexo, amizades, personalidades, sobre seus animais de estimação, sobre sua mãe, sobre questões pessoais com seu namorado Caio, sobre sua vida escolar e seus traumas relacionados a aparência, sempre com a presença de espírito de colocar o telespectador a vontade, como se fosse um amigo, conversando com ela pessoalmente. 

Em sua fala ela demonstra ter valores claros relacionados aos direitos humanos, mantendo sempre uma postura de respeito ao próximo como diferente e legítimo em suas escolhas, sejam elas quais forem, mas mantendo um bom humor em tudo o que coloca. Mesmo nas questões mais sérias ela se coloca como aberta a estar errada e a não dá de forma alguma a palavra final sobre um assunto, mas apenas a sua opinião e a sugestão de que as pessoas encontrem seus caminhos e se divirtam na vida. 

Acredito que o segredo de seu sucesso seja justamente a sua liberdade em mostrar de forma simples suas opiniões sobre todo o tipo de coisa, mesmo aquelas que são mais complexas como a filosofia e a arte, "destabulizando", ou seja, tirando o tabu de temas diversos com a capacidade de nos fazer rir de nós mesmos, enquanto rimos dela também em sua honestidade e espontaneidade particulares. 

A quem se interessar por conhecer essa figura, recomendo assistir sem preconceitos, pois como ela mesma esclarece no rodapé do canal, não há roteiro para a produção deles, que são bem livres, leves e soltos. 

O canal pode soar bobo para alguns e até pesado para outros, dependendo de como pegar em cada um cada uma das questões comentadas pelo casal (Caio participa quase sempre atrás das câmeras, comentando muitas das ideias de Julia). 

De qualquer maneira é muito interessante poder perceber o tipo de vinculação e exposição que a internet propõe, dando caminhos tão diversos como uma opção profissional às pessoas que experimentam se expor e descobrir novos caminhos para si mesmas através da rede. Acho que seus vídeos fazem as pessoas se sentirem de alguma forma menos sozinhas. Só isso já é muito importante!


Espero que promova no mínimo alguns sorrisos em vocês.


Um abraço,
Carol




Afirmações



Olá, 

o texto abaixo escrevi há mais de dez anos, num antigo blog, mas como gosto muito dele, resolvi repostá-lo aqui. 

Algumas meninas vão a “raves”. Os garotos vão aos bares. Os músicos vão aos shows e os cineastas aos cinemas. Os gays vão aos guetos. Os namorados vão ao motel, os casados vão à casa da sogra. Os pais vão ao shopping, ao parque, vão até a escola. Todos vão ao supermercado. Todos comem e todos vão ao banheiro. Os homens vão ao masculino e podem usar o mictório. As mulheres não.
As mulheres podem engravidar, os homens não. Mas podem fazer xixi em pé. Os aleijados não. As crianças podem usar fraldas e os velhinhos também. Os jovens podem fazer piercings se os pais deixarem (se não deixarem, também).
Menores de idade podem dirigir, mas podem levar os pais para a cadeia. Adultos podem ser apaixonar por crianças e irem para a cadeia. Crianças sempre se apaixonam pelos adultos e nunca vão para a cadeia, só vão se assaltarem um adulto. Ou uma criança, ou um velhinho.
Os jovens têm mais energia sexual. Os adultos e crianças também têm. As crianças não sabem o que é “sexual”. “- Sexual é desejo, meu filho”. É querer. E querer, todo mundo quer, alguma coisa. Mesmo que não saiba o quê.
No banco, as pessoas fazem fila. No McDonald´s, no refeitório, no banheiro da balada, na entrada de casa, no dia do aniversário do amigo também. Filas se organizam para que todos tenham sua vez. Mais, ou menos, as filas funcionam. Às vezes elas falham e as pessoas não podem ter cada uma a sua vez. Algumas pessoas furam as filas.
Homens, mulheres, crianças e velhinhos se olham no espelho. Os cegos não olham. Todos ouvem música. Os surdos não ouvem nada. Alguns se reconhecem no espelho. Alguns psicóticos não se reconhecem, nem dentro, nem fora do espelho. Nem os bebês. Os bebês não entendem muitas coisas. Vão entendendo bem devagarinho. Ou achando que entenderam. E depois descobrem que entenderam tudo errado e começam a entender tudo de novo. Às vezes certo, às vezes errado, de novo. E às vezes nunca entendem nada. Às vezes morrem. Até os bebês morrem. E ninguém gosta de pensar nisso, mas que eles morrem, eles morrem. Por que quando há alguma coisa errada ou há um acidente alguém pode morrer. E um bebê é muito frágil (por que não entende nada) e morre ainda mais rápido do que uma criança, um homem, uma mulher ou um velhinho.
Às vezes se morre quando não há nada errado. É preciso que haja sempre pelo menos alguma coisa errada. Para não morrermos. Não morrer é quando a gente sabe que está vivo. Se a gente não sabe, a gente morre. Sem querer.
E geralmente não se quer morrer. Raras vezes se pensa que se quer, mas em geral é mentira. Pode ser uma desesperança. Uma preguiça de viver, ou uma angústia maior do que se está conseguindo suportar naquela hora. Às vezes é genuína essa vontade e se morre mesmo. Algumas pessoas se suicidam nessa hora. E nunca podemos saber porque o fizeram, porque elas não voltam para nos explicar. E nós ficamos bravos, curiosos, tristes, ou com vontade de fazer igual, mas nem sempre fazemos.
Amor e morte estão muito próximos, dizem. Dizem que o ápice do sexo é uma sensação que podemos comparar à da morte. Como podemos comparar algo à morte se nunca morremos antes? Nunca morremos e falamos sobre como é a morte, como se pudéssemos metaforizá-la. E podemos. Podemos metaforizar qualquer coisa. Pra isso servem as metáforas. E pode ser que elas sirvam para alguma coisa, por exemplo, para nos fazer pensar na morte de um jeito menos desconhecido como olhávamos antes de metaforizá-la. Pelo menos serve pra escrever um texto como esse. E não chegar a conclusão nenhuma.

Um abraço,
Carol